Anivaldo de Miranda Pinto *
Um dos históricos atos contra a instalação de usina nuclear em Itacuruba (PE)
Muito se fala do Rio São Francisco e de sua inegável importância. Mas pouco se comenta sobre os enormes desafios e principalmente sobre as grandes ameaças que pairam como uma “espada de Dâmocles” sobre o destino desse gigante que simboliza como nenhum outro a integração do território nacional.
Inserido em partes expressivas de 5 estados e do Distrito Federal, o Velho Chico e seus afluentes representam quase que solitariamente a única alternativa de disponibilidade hídrica para três importantes e peculiares recortes do Brasil: o Norte de Minas Gerais, o enorme semiárido brasileiro e a região Nordeste do nosso país.
Por isso mesmo costumo dizer que esse incomum rio brasileiro não tem plano “B” uma vez observado no contexto estratégico dos 8% do território nacional ocupado por sua bacia hidrográfica, dos mais de 14 milhões de brasileiros e brasileiras que nela vivem, do peso inegável da economia que dele depende e da biodiversidade que representa. Na hipótese de grave acidente comprometedor da qualidade e quantidade de suas águas não haverá como substitui-lo em seu papel estratégico. Ferir de morte o rio São Francisco é, portanto, quase que como enfiar um longo e afiado punhal no coração do Brasil. E isso não é figura de retórica.
O curioso é que apesar dessa evidência, pouco se faz para prevenir as possibilidades de que catástrofes aconteçam, o que ficou evidente, só para citar um exemplo recente, quando do rompimento da barragem de rejeitos da empresa Vale em Brumadinho, Minas Gerais, crime ambiental de grandes proporções que atingiu o Paraopeba, um dos grandes rios afluentes do rio São Francisco, e por pouco não se estendeu à calha central deste último.
Outras fontes potenciais de ameaças semelhantes persistem, seja na forma de inúmeras barragens de rejeitos de minério mal concebidas e construídas, seja na forma de novos barramentos pretendidos para o seu leito e que podem acentuar a crise que já atinge a biodiversidade aquática declinante, seja na forma de desmatamento insano dos biomas essenciais para a garantia das vazões franciscanas, como é o caso, principalmente, do bioma do Cerrado.
Todavia a maior ameaça potencial ao rio que não tem plano “B” é, sem dúvida, a ideia tresloucada de construção de uma central nuclear às margens e com uso das águas do rio São Francisco na região que, em caso de acidente nuclear, apresentar-se-iam as maiores vulnerabilidades imagináveis em termos de enfrentamento de situação emergencial diante da qual o Brasil e, principalmente o Nordeste, não teriam cacife nenhum para contornar, a começar pelo viés do abastecimento de água a partir da única grande fonte desse abastecimento que seria precisamente o próprio rio São Francisco.
O mais aviltante na insistência através da qual o poder econômico promove o projeto dessa central nuclear é o fato de que a Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco e a enorme população que nela habita possuem, em termos de energia hidráulica, solar e eólica, um cabedal de fontes incomparavelmente mais baratas, menos perigosas e menos degradantes que dispensam completamente aventuras tecnológicas e econômicas dessa natureza. Lutar contra essa central nuclear é, portanto, afastar de vez o principal pesadelo que ronda a continuidade e vitalidade desse rio tão emblemático, mas tão maltratado desde o dia em que os colonizadores portugueses pisaram no solo brasileiro.
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(*) Anivaldo de Miranda Pinto - Jornalista, Coordenador da Câmara Consultiva do Baixo São Francisco, ex-presidente e atual integrante da Diretoria Colegiada do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco.
Foto: João Zinclar
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Publicação da Campanha Nacional da Articulação Antinuclear Brasileira pela não conclusão de Angra 3 e
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