Angra dos Reis (RJ) e Caetité (BA): territórios em constante insegurança nuclear, com moradores cercados pelos medos atômicos.

Neste início de 2024, as cidades produtoras da energia nuclear brasileira, Angra com duas usinas, e Caetité com as minas de urânio, vivem em cenários de problemas recorrentes. Um vendaval destelhou instalações da mina radiotiva baiana, a produção de urânio teve de ser paralisada. E falhas no sistema mecânico das turbinas de Angra 1 levaram à paralisação da unidade. Esta série de ocorridos deixa especialistas e a sociedade em alerta constantes.

Se não temos segurança nas instalações atuais, como podemos aceitar que o PAC financie estudos de viabilidade para a extensão da vida útil de Angra 1 por mais 20 anos e de quebra a continuidade das obras de Angra 3? Como podemos aceitar a expansão das minas em Caetité por mais décadas, se problemas estruturais de suas instalações seguem recorrentes?

Para compor o quadro de negligência do Programa Nuclear Brasileiro, no início de 2024, houve na cidade de Resende (RJ) uma invasão feita por jovens na fábrica das "pastilhas" de urânio (produto para abastecer as usinas). Lembrando que nessa mesma fábrica, considerada Área de Segurança Nacional, em meados de 2023 houve furto de pastilhas de urânio que até hoje não tiveram investigações concluídas.

Incidentes nucleares em série

No finalzinho de 2023, também houve a confirmação de furtos de cabos e fios da usina Angra 1, além de um incêndio num almoxarifado do parque das usinas. Na opinião da antropóloga Gláucia Silva, professora aposentada da UFF - Universidade Federal Fluminense e do Programa de Pós Graduação em Meio Ambiente da UERJ - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, estes problemas evidenciam que existe uma falha grave na segurança e no controle de áreas onde existem atividades com risco à saúde: "Tanto a invasão quanto o roubo são alarmantes, inaceitáveis. A atividade nuclear é muito perigosa, envolve muito risco ao bem estar das populações e por isso precisa ser muito controlada, com muitas regras de segurança e que estas regras sejam cumpridas. Quando há invasão ou furto, mostra que há uma grande fragilidade de vigilância e controle da segurança destes espaços. A gente não deve aceitar isso! É uma coisa grave", alerta e completa "isso representa um grande risco para a sociedade".

A antropóloga traz ainda uma outra reflexão. "A atividade nuclear é antinatural e antissocial. Uma sociedade nuclearizada tende a ser não democrática (...)", pondera.

A produção do ciclo nuclear é insustentável, usinas e suas minas radioativas deixam rastros de destruição em nosso planeta. Nem limpa, nem renovável. Os mitos sobre a energia nuclear são desmontados por Gláucia: "Toda usina nuclear está jogando radioatividade no ambiente diluída com água limpa. Não é de forma nenhuma sustentável", alerta.

Autora de "Angra 1 e a Melancolia de uma era: um estudo sobre a construção social do risco", Gláucia lembra que os resíduos industriais deixados pela humanidade ainda têm impacto real desconhecido: "A transformação do urânio em urânio enriquecido não acontece na natureza. O Brasil tem opções muito melhores em nossa matriz energética. O nuclear é um risco que não precisamos correr."

Lucro Radioativo: desprezo pelo social

O desenvolvimento econômico despreza o impacto social da atividade nuclear. Riquezas naturais podem trazer grandes desastres para os povos das terras onde elas são encontradas. Foi assim em toda a História e não é diferente agora. Com a desculpa de que o desenvolvimento financeiro traz recursos que poderiam ser convertidos em benefícios sociais, comunidades próximas à atividade mineral e de produção nuclear perdem sua saúde e a sua paz.

"Cálculos econômicos não são objetivos e trazem uma grande base de ideologia. Quem ganha? E quem perde?". Na opinião de Gláucia, o debate sobre a exploração mineral de urânio e construção de usinas nucleares não deveria passar apenas por cálculos matemáticos objetivos sobre o que consistiria em ganhos monetários para uma região. É preciso colocar o olhar da sociedade na discussão sobre um tema tão sensível: "Tudo é propaganda de uma visão de mundo que não está atenta para as catástrofes que podem acontecer. Eu acho que a continuidade deste tipo de atividade para produção energética contradiz completamente o que parece ser a tendência de um futuro menos ameaçado."

Temas como racismo ambiental têm tomado força no debate sobre desenvolvimento. O Brasil para ser saudável, precisa também ser livre do nuclear. Angra dos Reis e Caetité não devem ser escravizadas pelo lobby nuclear. Pelo contrário, ambas merecem liberdade plena para o bem viver de seus cidadãos.

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